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Foto do escritorLuiz Carlos Azedo

Cachorros, o “cerco e aniquilamento” da cúpula do PCB



Severino Theodoro de Mello, o Pacato, militante histórico do PCB, era “Vinícius”, um super espião da inteligência militar nos anos de chumbo

O novo livro de Marcelo Godoy, “Cachorros” (Alameda), já à venda na internet, remove velhos esqueletos dos porões do regime militar e sua infiltração nas organizações de esquerda, sobretudo a cooptação de um dirigente histórico do antigo PCB, Severino Theodoro de Mello.

O novo livro de Marcelo Godoy, “Cachorros” (Alameda), já à venda na internet, remove velhos esqueletos dos porões do regime militar e sua infiltração nas organizações de esquerda, sobretudo a cooptação de um dirigente histórico do antigo PCB, Severino Theodoro de Mello.

Mello contribuiu para sequestros, mortes, prisões e desaparecimentos que ajudaram a neutralizar o PCB nos anos 1970. Com a publicação do livro “A Casa da Vovó: uma biografia do DOI-Codi, relatos inéditos de policiais e militares que atuaram nos centros de torturas e assassinatos do regime”, ganhador dos prêmios Jabuti (não ficção) e melhor Ensaio Social da Biblioteca Nacional, questionamentos de dirigentes oriundos do antigo PCB sobre esses depoimentos, que classificam os infiltrados como “cachorros”, desafiaram Godoy a aprofundar suas investigações, sobretudo sobre o veterano dirigentes do PCB.

O resultado é seu novo livro, lançado 10 anos depois, com revelações surpreendentes, entre as quais a morte de Theodoro de Mello, aos 105 anos, no Recife, tão clandestinamente como fora a sua trajetória de dirigente do antigo Partidão. Godoy somente soube do paradeiro de “Vinícius” ao descobrir que Mello deixara de receber os soldos de capitão do Exército brasileiro, por falecimento. A infiltração no PCB era estratégica para os militares, porque o Partidão conseguiu se rearticular durante a abertura e influenciar toda a oposição democrática, até a eleição de Tancredo Neves, apesar dos duros golpes que sofreu após a vitória do MDB de 1974.

Via chilena

A organização do aparelho de repressão do regime militar atingiu novo patamar após o golpe militar do general Augusto Pinochet, no Chile, em 1973. Militares brasileiros que auxiliaram os colegas chilenos a interrogar brasileiros no Estádio Nacional foram identificados e entrevistados por Godoi. Doutor Pirilo, o capitão Antônio Pinto, da Aeronáutica, conta no livro como foi a morte de Stuart Angel Jones e como interrogou outros integrantes do MR-8. Foi um informante no Chile que deu informações para o sequestro e desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva.

Outro infiltrado ajudou os militares na caçada ao ex-campeão do Exército Carlos Lamarca, morto no interior da Bahia. Hoje, é um banqueiro de bicho no Norte do país, ligado ao Capitão Guimarães, do Rio. O coronel Romeu também conta como cooptou o dirigente do PCdoB Manoel Jover Telles para entregar a reunião do Comitê Central do PCdoB onde seria feito um balanço da Guerrilha do Araguaia, na Lapa, em São Paulo, em 1976. O episódio terminou com as mortes de três dirigentes do partido. O coronel entregou a degravação da conversa dele com Jover Telles. Romeu era subcomandante do DOI do Rio de Janeiro.
A Cia também se infiltrou no PCB, no começo dos anos 1960. O “Agente Carlos” acompanhara Prestes em viagem para Moscou e Pequim e passou informações detalhadas sobre as conversas de Prestes com Mao Tse Dong e com Nikita Kruschev. Adalto Alves dos Santos pode estar ligado à queda das famosas cadernetas de Luiz Carlos Prestes, logo depois do golpe de 1964. Foi preso pelo Cenimar (Marinha) durante a Operação Master e revelou para quem trabalhava.

Um dos seus relatórios dizia que o partido mantinha contato com cerca de 80 bispos católicos brasileiros, 10 dos quais classificados como comunistas, entre os quais os cardeais Eugênio Salles e Evaristo Arns, e 2 mil padres. Em 1973, o documento foi encaminhado pelo Itamaraty ao Núncio Apostólico no Brasil. Responsável pelos contatos com a Igreja, o advogado e jornalista potiguar Luís Ignácio Maranhão Filho, membro do Comitê Central do PCB, foi sequestrado no Rio de Janeiro e assassinado pelo DOI-Codi de São Paulo.

Áudios de reuniões do Comitê Central do PCB em Moscou e Praga, que foram gravadas, mostram que a suspeita da existência de um informante mobilizou a cúpula comunista com discussões envolvendo Prestes e outros dirigentes do partido, sem que eles soubessem que o traidor estava presente participava dos debates. Severino Teodoro de Mello fora enviado pelos militares para Moscou a fim de continuar seu trabalho como espião.

Depoimentos inéditos do próprio Mello ao repórter Marcelo Godoy, todos gravados, contam a razão do seu acordo com os militares, após ser preso. Solto, era vigiado em seus encontros, causando muitas quedas em SP, RJ, GO, BA e RS, entre 1974 a 1976. Melo continuou trabalhando para o Cisa até 1995. O PCB já havia mudado de nome e sigla, passando a se chamar Partido Popular Socialista (PPS), mas continuou espionado, sem que o presidente Fernando Henrique Cardoso soubesse.
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